quinta-feira, 1 de julho de 2010

NOTICIAS DO DN : Curta-metragem mostrará a saga de Francisca Carla

Curta-metragem mostrará saga de Francisca Carla
O local onde Francisca Carla morou, durante a segregação social sofrida devido à hanseníase, deu lugar a uma capela construída em sua homenagem


Equipe de produção do curta-metragem é formada por Márcio de Araújo Pontes, Natanael Portela de Sousa, Santiago de Sousa Oliveira e Divaneide Portela


Francisca Carla
A segregação social de Francisca Carla, vítima de hanseníase no século passado, é roteiro de um curta-metragemTianguá. Uma idéia na cabeça, um projeto sobre a mesa. Uma produção cinematográfica poderá levar à tela dos curta-metragens a saga de uma camponesa que teve sua mocidade interrompida por uma doença, que no passado era conhecida como “lepra” ou “mal da peste”. A história envolve Francisca Carla, uma empregada doméstica vítima de hanseníase, e que depois de descoberta a doença, passou a viver em total isolamento até a sua morte, com 43 anos de idade.Juntando depoimentos de pessoas que tiveram contato com Francisca Carla, documentos e objetos da época, fatos históricos, os produtores culturais Natal Portela, Márcio de Araújo, Daniel Sá, Santiago de Sousa, Divaneide Portela e Robério Belchior programam, com ajuda de instituições governamentais, a partir de janeiro de 2009, começar a rodar o filme: Francisca Carla – Narrativas e devoção. Com isso eles almeijam imortalizar essa história regional, valorizando a memória oral e o universo místico e simbólico que envolve a figura de Francisca Carla. Hoje um mito religioso no imaginário popular, um elemento pulsante na cultura de Tianguá, cidade de região da Ibiapaba.Segregação socialA descoberta da doença de Francisca Carla aconteceu em uma das festas que era realizada pelos patrões e também padrinhos de batismo, Joaquim Carlos de Vasconcelos e dona Maria Rodrigues. Na festa, um almoço dominical, estava entre os convidados um profissional da saúde, apontado como um médico, que acabou por revelar para os patrões que a jovem estaria com “morféia”. Relatos da época diz que naquele momento os convidados começaram a rejeitar a comida posta à mesa, e desde então o clima no casarão não era mais de alegria, mas de preconceito.Portadora da hanseníase ela foi segregada do meio social numa época em que o estigma criado sobre a lepra causava repulsa aos enfermos. O único modo de tentar controlar a doença era confinando os leprosos. Mas como em Tianguá na década de 50 não existia leprosários, Francisca Carla foi isolada, no meio da mata, onde passou o resto de sua vida.Seu exílio perdurou não se sabe ao certo, entre cinco a oito anos, sobrevivendo de doações que eram deixadas por pessoas, que muita das vezes transitam pelo caminho uma única vez por semana. A estrada ligava a comunidade ao Centro da cidade de Tianguá.No livro de registro de óbitos do Município de Tianguá, a reportagem encontrou o atestado de morte da doméstica. Sob o número 2.928, de 23 de abril de 1953, foi registrada oficialmente a morte da jovem Francisca Quirino, nome verdadeiro de Francisca Carla. O documento revela ainda que o atestado de óbito foi testemunhado pelo senhor Joaquim Carlos de Vasconcelos, patrão e dono da fazenda onde a jovem foi encontrada morta. Escrito a bico de pena, está descrito como era a falecida: pele morena, 1,70m, cabelos longos, castanhos escuros e olhos castanhos médios. No dia em que foi encontrada morta, Francisca Carla usava vestido de mangas, abaixo do joelho, com chinelo de tiras entre os dedos.Origem da idéiaMárcio de Araújo Pontes, 30, um dos produtores do curta-metragem conta que a idéia de fazer o filme que relata a saga desta doméstica surgiu depois de uma experiência vivenciada com o filme “Marróia”, que acabaram de exibir. “A partir daí nasceu a idéia de imortalizar Francisca Carla. Por meio deste documentário, que será mostrado para todas as pessoas que têm interesse em se aprofundar no assunto”, diz.Natanael Portela de Sousa, 31, o “Natal Portela”, assegura que as parcerias já estão garantidas. “Estamos contando com o apoio da Prefeitura de Tianguá, pela Secretaria de Educação, Cultura e Turismo; do Governo do Estado, da Secretaria de Cultura do Ceará, Secretaria de Turismo também do nosso Estado e, é claro, com o apoio já assegurado do Ministério da Cultura (Minc), por meio do edital de Nº O2/2007, do projeto de produções audiovisuais digitais inéditas”, revela o produtor Natal.InvestimentoO investimento da produção eles não fecharam, mas acreditam que deva ficar em torno de R$ 100 mil. “Vamos ter que montar o figurino, recuperar a casa onde a festa aconteceu, promover deslocamento de pessoal, comprar mais equipamentos, enfim, cálculos que a gente ainda está finalizando”, disse Natal.Robério Belchior, produtor executivo do filme, conta que “precisamos ir mais além, queremos com esse filme envolver os ativistas do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan). Uma delas, a Elke Maravilha, pessoa com que tenho afinidade, já demonstrou interesse em participar das gravações”, revela Belchior, que está com viagem marcada para Brasília e Rio de Janeiro, para agendar a participação de outros integrantes do movimento, o que enriquecerá o roteiro.






MEMÓRIALivro conta história da domésticaTianguá. O escritor Luiz Gonzaga Bezerra, 56 anos, natural de Ubajara, e que reside em Tianguá, narra no livro de sua autoria “Um olhar sobre Francisca Carla e outros fatos de Tianguá”, que ela nasceu na cidade de Ubajara em 1910, não sabendo precisar o dia nem o mês. Era filha de Ana Quirina e pai ignorado.Ainda na infância, foi adotada aos oito dias de nascida pelo casal Joaquim Carlos e Maria Rodrigues de Vasconcelos que, mais tarde, passaram a ser praticamente seus parentes mais próximos, bem como padrinhos de batismo.Um dos motivos da adoção, segundo narra o escritor, deveu-se por condições pessoais da família. Períodos de secas freqüentes no Ceará, a contar 1915, 1932 e 1942. Demonstrando lealdade à família que a adotou e pela atividade doméstica, não contraiu o matrimônio e não quis constituir família. Ela tinha 38 anos, aproximadamente, quando passou a viver isolada em seu confinamento no Sítio Lagoa da Pedra, distante 4km de Tianguá, local de propriedade do senhor Silvério Gomes Fidélis.Luiz Gonzaga descreve em um trecho do seu livro que, “Francisca Carla, no decorrer de sua adolescência — trazia sempre entre os dedos dos pés um pano embrulhando os dedinhos. 24 anos mais tarde deu-se a descoberta da doença. (...) O clima festivo e de tranqüilidade transcorria muito bem sobre animadas conversas em plena natureza, quando estando ali um visitante, profissional da Medicina, percebeu que aquele nódulo da orelha como sendo sinais da doença morféia, conhecida lepra, e assim, considerada uma doença altamente contagiosa e sem tratamento naquele tempo de meio século atrás...”. Após anos de segregação social e morte, sua história passou a atrair a devoção de populares, que rezavam em seu nome.Sofrimento Francisca CarlaA empregada doméstica Francisca Carla viveu na década de 50 do século passado no município de Tianguá. Ao ser acometida pela hanseníase, sofreu segregação social, numa casa isolada na zona rural. Hoje, seu túmulo atrai devotos.

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